segunda-feira, janeiro 29, 2007

Pausa

O poeta grego que comparou o homem às folhas que não duram,
quando o inverno lhes roubou a esperança de viver de acordo com
os seus desejos, não saiu esta tarde para o campo, nem viu o
corpo que se interpôs entre o sol e os arbustos, ofuscando
o céu com a sua brancura de nuvem primaveril. Perguntou,
no entanto, de que serve a vida, e para que serve a alegria,
se não existe, para além delas, o horizonte dourado do amor;
e afastou da sua frente o crepúsculo, dizendo que preferia
a madrugada, logo que o galo canta, para despertar com
o próprio dia. Esse poeta, que o pó dos séculos sepultou,
e não chegou a encontrar qualquer resposta para as suas
dúvidas, aconselhou os que o liam a que se divertissem,
antes que a morte os surpreendesse. E lembro-me, por
vezes, deste pedido, ao pensar que a memória de alguém
se pode limitar a uma pequena frase, nem que seja a mais
banal das sentenças, que nos vem à cabeça numa ou noutra
circunstância. Então, o poeta grego continua vivo; e esta
tarde, por trás dos arbustos, ouvi a sua voz no vento que
por instantes soprou, trazendo com a sua frescura o sentimento

que sobrevive a todas as estações de uma vida humana.

O que é a vida?, Nuno Júdice.

segunda-feira, janeiro 22, 2007

Das coisas simples

Acolhe-me no presente do teu regaço. Resguarda-me no calor tépido da tua pele, na madrugada acariciada por um lençol de ternura. Leva-me para junto do meu destino, que inadvertidamente acabará por se cumprir. Ensina-me a ver a claridade de um quarto nocturno que cega a distância entre os corpos e o tempo para além deles. Revela-me todas as formas sonhadas ou por inventar, de num mesmo instante reduzir a um único os fragmentos do nosso sentir. Assim, poderemos subsistir das coisas simples como o amor e a poesia. De tão simples que são, no âmago da complexidade da sua existência e na sua estrondosa beleza, que nos compelem a vivermos no ritmo diário de cada novo poema que de nós se aproxima - desconhecido de rosto familiar - e de que nada sabemos sobre o que nos trará, o que nos deixará, ou o que de nós levará.
Cai em mim um desmedido querer ser verso desse poema e tocar em ti, verso que por sua vez também me toca e, numa dança infindável, transforma as minhas palavras em bailarinas nuas, que, como conchas, nos revelam os murmúrios profundos do amor.

sábado, janeiro 20, 2007

Fiama [1938-2007]

Nada tão silencioso como o tempo
no interior do corpo. Porque ele passa
com um rumor nas pedras que nos cobrem,
e pelo sonoro desalinho de algumas árvores
que são os nossos cabelos imaginários.
Até na íris dos olhos o tempo
faz estalar faíscas de luz breve.

Só no interior sem nome do nosso corpo
ou esfera húmida de algum astro
ignoto, numa órbita apartada,
o tempo caladamente persegue
o sangue que se esvai sem som.
Entre o princípio e o fim vem corroer
as vísceras, que ocultamos como a Terra.

Trilam os lábios nossos, à semelhança
das musicais manhãs dos pássaros.
Mesmo os ouvidos cantam até à noite
ouvindo o amor de cada dia.
A pele escorre pelo corpo, com o seu correr
de água, e as lágrimas da angústia
são estridentes quando buscam o eco.

Mas nós sentimos dentro do coração que somos
filhos dilectos do tempo e que, se hoje amamos,
foi depois de termos amado ontem.
O tempo é silencioso e enigmático
imerso no denso calor do ventre.
Guardado no silêncio mais espesso,
o tempo faz e desfaz a vida.


Fiama Hasse Pais Brandão.

terça-feira, janeiro 16, 2007

Damien Rice - Cannon Ball

sábado, janeiro 13, 2007

A promessa

Vi-te antes de te olhar. Vejo os traços do rosto da tua alma; as linhas inscritas na tua pele; gotas de emoções que as percorrem, que te fazem vibrar o corpo e te resgatam a aparição da luz a desmaiar de prazer no teu peito. Vejo-te para além da interdição de revelações secretas. Vejo-te na sobreposição das certezas de quem ama, sobretudo isso, de quem te olha para além dos espelhos baços das aparências, de quem te fixou o perfil inacessível de pétalas vermelhas a caírem na meditação de um poema.
Os encontros físicos são formalidades dos corpos, apenas isso; concretizações de olhares e gestos. A existência que nos une transcende os limites desse universo, o limiar da rigidez do orgânico.
Deferente ao amor, ouso pousar nos teus lábios a promessa que me habita o silêncio da voz. A promessa que me precede o desejo crescente de te possuir na revelação de cada abraço que enlaça os nossos corpos, de cada suspiro que finalmente nos acolhe na exaustão – quais náufragos de barcos de palavras – e de cada longo beijo, onde rios invisíveis nos dão a beber a infinitude de nos amarmos.

domingo, janeiro 07, 2007

Os silêncios da fala

São tantos
os silêncios da fala

De sede
De saliva
De suor

Silêncios de silex
no corpo do silêncio

Silêncios de vento
de mar
e de torpor

De amor

Depois, há as jarras
com rosas de silêncio

Os gemidos
nas camas

As ancas
O sabor

O silêncio que posto
em cima do silêncio
usurpa do silêncio o seu magro labor.

Os silêncios da fala,
Maria Teresa Horta, in Vozes e Olhares no Feminino.

quarta-feira, janeiro 03, 2007

I have nothing if I don´t have you!

Share my life,
Take me for what I am.
Cause I'll never change
All my colors for you.

Take my love,
I'll never ask for too much,
Just all that you are
And everything that you do.

I don't really need to look
Very much further/farther,
I don't wanna have to go
Where you don't follow.
I will hold it back again,
This passion inside.
Can't run from myself,
There's nowhere to hide.
(Your love I'll remember forever.)

Don't make me close one more door
I don't wanna hurt anymore
Stay in my arms if you dare,
Or must I imagine you there.
Don't walk away from me
I have nothing, nothing, nothing
If I don't have you.

You see through,
Right to the heart of me.
You break down my walls
With the strength of your love.

I never knew
Love like I've known it with you.
Will a memory survive,
One I can hold on to?
I don't really need to look
Very much further/farther,
I don't wanna have to go
Where you don't follow.
I will hold it back again,

This passion inside.
Can't run from myself,
There's nowhere to hide.
(Your love I'll remember forever.)

I Have Nothing,
Whitney Houston