domingo, outubro 29, 2006

Mais um...

Passaram tão depressa. Anos carregados de sonhos. Tempos sustentados pela ânsia de viver, de concretizar o prometido, de arriscar o inesperado na improvisação do teatro da vida.
E a busca constante, a insatisfação que nutre o desejo por mais e maior; o ímpeto de refazer o imperfeito até à utopia da perfeição idealizada. E o cogitar pulsátil aliado ao instinto que não adormece, não repousa, apenas fecha os olhos, apenas engana o sono e o corpo exausto da jornada.
Anos de tenra juventude que foram ficando para trás, na distância inevitável das memórias que me vislumbram, como testemunhas da pessoa que tenho sido.
Para mim, os aniversários são datas de comemoração, mas também simbolismo de introspecção e balanço do que se tem sido e vivido. E o dia de hoje não foi excepção a esse ritual tão pouco evitável ou dispensável por mim.
Assim, abri a gaveta das memórias, que a minha mente afavelmente me disponibilizou. Depois servi-me delas. Às melhores, às excelentes, àquelas que imobilizaram raros momentos de brutal felicidade, brindei-as com champagnhe e sorrisos, beijei-as com paixão e saudade; ofereci-lhes caviar e morangos. A mim, extasiaram-me com o seu imprevisto retorno, com as suas rosas vermelhas, suas essências e infusões líricas que me percorreram o corpo e a alma.
Em outras gavetas, memórias desbotadas, de odores extintos no passado, trouxeram-me os momentos de desilusão.
Porque, percebi-o hoje nitidamente, as desilusões foram o meu maior luto. Desilusões que fui tendo com os outros e comigo própria. Situações e momentos em que fui um ser aquém de si próprio... silêncios, receios, incertezas, inépcias desembocados na espera incerta de um tempo que, afinal, não se entrega nas nossas mãos, mas que constantemente nos escapa.
Desilusões com os outros, quando eu não falhara nem faltara ao prometido, mas eles sim. Momentos em que falharam e faltaram às promessas; que inverteram os gestos da amizade e do amor na direcção mais cómoda a dado momento, contrária à esperada por convicções e ideais albergados no sentido das palavras. Momentos em que alguém se esqueceu de que a sinceridade não tem preço, a confiança também não, e que nada é gratuito excepto o que estamos dispostos a oferecer ao outro sem nada esperar em troca.
A estas, tomei-as no meu peito, afaguei-as e encostei ao meu rosto as suas faces sulcadas pelo tempo. O seu toque já não doía como outrora, apenas se fazia sentir com a amenidade de ventos que em tempos foram parte de temporais. Mas dos meus olhos, lágrimas incontidas deslizaram lentamente. E da minha pele para aquela pele, que já não me pertence...tal como as desilusões em que fui tropeçando ao longo do caminho.

Hoje, em pé e de cabeça levantada, olho o mundo de frente. Caminho pelos meus passos, mais firmes e seguros do que nunca. E embora não saiba aonde eles me levam, continuo a vislumbrar à distância a beleza de certas paisagens, de certos destinos. E acredito que um dia as minhas memórias serão também, as memórias do meu encontro com o que falta à minha vida.

13 Comments:

Blogger Unknown said...

My Mind: um aniversário não é só mais um ano que passa - é um marco, é uma etapa na viagem que é a nossa vida.
Por isso é inevitável que, pelo menos nesse dia, abramos as gavetas da memória, e avaliemos o que elas guardam de nós.
Delas, quantas vezes, retiramos mágoas, desilusões, frustrações... Mas haverá sempre outras que, às vezes bem lá no fundo, guardam tesouros que julgávamos esquecidos. É, então a hora de fechar as outras gavetas e deixar estas entreabertas.
Várias vezes já aludiste ao teu optimismo - ele servir-te-á de guia no caminho da esperança e do encanto.
A tua determinação e coragem adivinho-as pela forma como terminas o teu testemunho.

Brindo à tua esperança, à tua felicidade e à tua vida - a TI!

E, em geito de prenda, deixo-te este poema de Nuno Júdice:

Segue Teu Destino

Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.
A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.
Suave é viver
só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.
Vê de longe
a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.
Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.

Um beijo

10:38 da tarde  
Blogger Mente Assumida said...

Cin Cin! :)

2:07 da manhã  
Blogger Anonyma said...

Memórias...
Não tenho memória de outros dias, de outros instantes, de outras paisagens...nem mesmo de outros anos.
E curiosamente ...aos poucos deixam de me fazer falta.
Passei a minha hora no mais comum dos meus lugares comuns, sem passado, e entre possibilidades.
E sabes...isso bastou-me.

12:08 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

My Mind, perdoa-me o uso abusivo da tua caixa de comentários em total off topic, mas houve um pormenor no comentário da j. que me intrigou e por isso uso esta caixinha para lhe fazer referência...

j., há dias espreitei o teu blog e concluí que és magistrada, ao ler este excerto deste post:
«Quanto à insolência – a que verdadeiramente me dá “voltas ao estômago” é a outra.
A que se traduz em palavras e gestos – mesmo que praticados por advogados engravatados, quando, por exemplo, me dizem que intimido testemunhas, ou quando oiço, em julgamento, um advogado dirigir-se às testemunhas, incluindo inspectores da P.J., tratando-os por tu...
E que bem me senti, ontem, com os meus jeans! Mesmo por baixo da beca (o autor do post tem obrigação de saber que o traje profissional dos magistrados é a beca e não a toga...)!
Não levei sapatilhas (não ficavam bem)...
Não levei havaianas (era afronta a mais, e o tempo chuvoso a tal desaconselhava)...
Mas as botas até foram bem com os jeans!»
.
Ora, o que me intrigou é que, sabendo tu a diferença entre uma beca e uma toga, não saibas que jeito se escreve com j, que por acaso até é a primeira letra do teu nome (que até dá para fazer um trocadilho com a história dos inspectores...).
Ora, como entre a tecla do g e a do j vem a do h, suponho que não se tenha tratado de um "despiste" de dedos.
Senhora Magistrada (não sei se Juiz de Direito, se Procuradora-Adjunta), permita então este reparo de uma advogada... E não leve a mal, que só o estou a fazer por graça e porque não é todos os dias nós, os da toga, vos podemos corrigir a vós, os da beca, sem que nos arrisquemos a que nos seja retirada a palavra... ;)
Espero não ser mal-interpretada e que percebas que estou simplesmente a brincar, até porque bem sei que este tipo de erros todos nós damos e também porque nunca julgo as pessoas por estes pormenores que, afinal, não passam disso mesmo: coisas sem importância. ;)

4:30 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

O comentário anterior saiu com a minha identificação incompleta...

4:30 da manhã  
Blogger Unknown said...

À my Mind peço antecipadamente desculpa por usar este seu espaço para aqui responder à mente assumida, mas espero que compreenda que não tinha outra forma de o fazer.

Mente assumida: tens toda a razão no reparo que fazes ao meu flagrante erro ortográfico; eu própria, já depois de publicado o comentário, ao dar-me conta do erro, dele me envergonhei...
Eu sei que também não serve de desculpa para o erro ortográfico, a circunstância de me achar extraordinariamente cansada (depois de mais de 16 horas consecutivas de trabalho...)quando o escrevi.
Tenho humildade suficiente para publicamente reconhecer os meus erros e aceitar reparos. Quem comigo priva sabe bem disso.
Só mais um esclarecimento: sou juiz, tal facto nunca constituiu obstáculo em aceitar ser corrigida por vós, os da toga, não me recordo de alguma vez ter retirado a palavra a um advogado, embora já tenha recorrido a algumas (poucas)advertências, sempre respeitei os advogados (achando-me também no direito de exigir reciprocidade de tratamento) e, por regra, mantenho uma relação muito cordial com a advocacia.
Por isso o meu post não é uma "declaração de guerra" aos advogados, como à primeira vista poderá parecer.
Isso não significa que não me assista o direito de me insurgir contra certas formas de exercer a advocacia, às vezes tão pouco éticas..., tal como como me insurjo contra certos comportamentos de colegas meus, dos quais me chego a envergonhar!
Finalmente, não levei a mal o reparo que, de resto, agradeço.

À My Mind - uma vez mais o meu pedido de desculpas por usurpar o seu espaço, tanto mais que não esperava estender-me tanto.

12:42 da tarde  
Blogger Unknown said...

Olha apenas para te dizer que continues a tua caminhada na vida, ainda tens muito para dar e deixa as desilusões de lado...vive cada dia intensamente...com esperança e garra e um sorriso rs
um beijo cheio de carinho
brisa de palavras

1:20 da tarde  
Blogger My Mind said...

j.: Obrigada pelas tuas palavras, pelo brinde e pelo poema (e eu sei que tu sabes, obviamente, que é "jeito"!) Lapsos acontecem aos melhores! :)

Sim, vou tentar seguir o meu destino...vou tentar regar as minhas plantas e amar as minhas rosas.
E nos momentos em que as sombras, porventura, ameaçarem o "meu destino", estou certa de que, entre outras palavras, também me lembrarei deste exaltante poema.
Beijos

6:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

'Your' Mind:
Que todos os mais anos venham com o mesmo jorro que hoje verte.

6:14 da tarde  
Blogger My Mind said...

mente assumida: obrigada pelo brinde! Eu adoro o cin cin!:)

Quanto aos teus comentários, já sabes que são sempre bemvindos.O segundo era dirigido à j. e ela até já respondeu...:) Isto por aqui andou animado.:D Acho que vocês as duas deveriam era ter enveredado pela área da saúde!Diz lá que a batinha branca também não é elegante?!:D

6:17 da tarde  
Blogger My Mind said...

anonyma: se dizes que isso te basta...
Mas parece-me que a memória tem um papel muito importante na integração/fusão do passado com o futuro.

6:31 da tarde  
Blogger My Mind said...

brisa de palavras: "...cada dia com esperança, garra e um sorriso." Parece-me um óptimo conselho!
Thank you (queres que eu traduza?!:)))
Beijo também para ti

6:40 da tarde  
Blogger My Mind said...

Sandra Costa: Gostei do "Your"!! :D
Pelo menos a vontade de que assim seja é grande...
Obrigada!:)

6:49 da tarde  

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